Alimentos Avoengos e a Prisão Civil dos Avós Devedores
Com efeito, os alimentos pressupõem a existência de um vínculo jurídico, e, no caso dos alimentos avoengos, isto é, aqueles devidos pelos avós a seus netos, trata-se de um vínculo lastreado na relação parental, já que podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação, consoante dispõe o artigo 1.694 do Código Civil Brasileiro.
A previsão legal acerca da possibilidade de fixação de alimentos em desfavor dos avós encontra-se positivada no artigo 1.696 do Código Civil, cuja redação, em síntese, dispõe que a obrigação alimentar é extensiva a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
Cumpre destacar, contudo, que a eventual fixação dos chamados alimentos avoengos, na esteira do enunciado n.º 342 das Jornadas de Direito Civil, deve observar as condições pessoais e sociais dos avós, sendo estes obrigados a prestar alimentos aos netos em caráter exclusivo, sucessivo, complementar e não-solidário quando os pais do alimentando estiverem impossibilitados de fazê-lo, caso em que as necessidades básicas deste serão aferidas, prioritariamente, segundo o nível econômico-financeiro de seus genitores.
Nos ensina o professor Conrado Paulina da Rosa, em sua obra “Direito de Família Contemporâneo”, a respeito da fixação de alimentos em desfavor dos avós do alimentando:
"Nesta esteira, após o esgotamento dos meios processuais necessários a coerção do genitor para o cumprimento da obrigação alimentar inclusive, por meio da decretação da sua prisão civil, é que passa a ser possível o redirecionamento da demanda aos avós. Assim a mera irregularidade eventual no pagamento da pensão por parte do primeiro obrigado, qual seja, o pai ou a mãe não permite a fixação liminar de alimentos avoengos. Todavia, em se tratando de devedor contumaz, por certo, a fixação alimentar dos ascendentes de segundo grau deverá ser realizada desde logo pelo juízo."
Estabelecida a possibilidade jurídica de se cobrar alimentos aos avós, quando, e tão somente quando, absoluta a impossibilidade de os pais assim o fazerem, cumpre-nos analisar o objeto da presente produção textual, isto é, da possibilidade ou não da prisão dos avós devedores de alimentos.
A prisão civil em razão do inadimplemento da obrigação de pagar alimentos está prevista tanto no artigo 528 (Cumprimento de Sentença) como no artigo 911 (título executivo extrajudicial), ambos do Código de Processo Civil.
A prisão civil dos avós do alimentando deve ser analisada sob 2 (dois) espectros, a saber:
Primeiro, os avós com menos de 60 (sessenta) anos, e, portanto, não protegidos pelo Estatuto do Idoso. Neste caso, ainda que a natureza dos alimentos avoengos seja complementar e subsidiária, consoante verbete sumular 596 do STJ , o princípio do melhor interesse do menor deve ser buscado a todo custo, permitindo-se, inclusive, a prisão dos avós devedores de alimentos, desde que: (i) tenha sido anteriormente proposta ação de alimentos em face do(s) genitor(es); (ii) tenha sido iniciado o cumprimento de sentença pelo rito da prisão (artigo 528 ou 911 do Código de Processo Civil); (iii) não tenha sido aceita a justificativa do devedor em relação ao inadimplemento dos alimentos devidos.
Em relação aos avós com mais de 60 (sessenta) anos, no meu sentir, deve ser feita a interpretação da legislação civil conforme a constituição. Isto implica no reconhecimento da vulnerabilidade do idoso, conforme prevê o artigo 230 da Carta Magna.
Também deve ser sopesado o princípio do melhor interesse do menor em consonância ao princípio da proteção ao idoso, previsto tanto na constituição como na Lei n.º 10.741/03 (Estatuto do Idoso).
Assim, nos casos em que os avós do alimentando tiverem 60 (sessenta) anos ou mais, o rito para o cumprimento de sentença que fixou alimentos deveria ser o da expropriação de bens, considerando, ainda, terem sido esgotados os meios de execução dos genitores, não sendo possível, portanto, a prisão dos avós sexagenários.
Caso o cumprimento da sentença (pelo rito da prisão) tenha sido iniciado antes dos avós devedores completarem 60 (sessenta) anos, e, ocorrendo esta idade no curso do processo, penso que o juízo deveria, de ofício, determinar a convolação do rito da prisão para o da expropriação de bens.
Em outras palavras, observada a natureza e as características dos alimentos avoengos, isto é, o seu caráter exclusivo, sucessivo, complementar e não-solidário, a prisão civil dos avós devedores de alimentos só será possível caso possuam menos de 60 (sessenta) anos, ante a proteção dada pelo Estatuto do Idoso, inobstante a possibilidade de se penhorar quantos bens bastem para pagar a dívida alimentar.
Por fim, vale destacar que a jurisprudência a respeito da temática ainda não se encontra consolidada.